Plenário conclui votação de gestão fraudulenta
Na sessão plenária desta quinta-feira (6), os ministros do Supremo Tribunal Federal concluíram o julgamento do item V da Ação Penal 470, que trata da imputação de gestão fraudulenta de instituição financeira aos réus ligados ao Banco Rural. O crime é tipificado no artigo 4º, caput, da Lei 7.492/86, que dispõe sobre os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional. Por unanimidade, os ministros decidiram pela condenação de Kátia Rabello e José Roberto Salgado; por maioria, vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, o Plenário concluiu pela condenação de Vinícius Samarane; por maioria, vencido o ministro relator, Joaquim Barbosa, a ré Ayanna Tenório foi absolvida.(Fotos de Carlos Humberto-STF).
Votos
O ministro-relator, Joaquim Barbosa, votou pela condenação dos quatro réus – Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Ayanna Tenório e Vinícius Samarane – quanto à imputação do crime de gestão fraudulenta de instituição financeira.
O ministro-revisor, Ricardo Lewandowski, votou pela condenação de Kátia Rabello e de José Roberto Salgado, absolvendo Ayanna Tenório e Vinícius Samarane. Da mesma forma, votou o ministro Marco Aurélio.
Os ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Ayres Britto votaram pela condenação de Kátia Rabello, José Roberto Salgado e Vinícius Samarane, e pela absolvição de Ayanna Tenório.
DECISÃO DO MINISTRO CELSO DE MELLO
Direto do STF - Decano do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Celso de Mello (foto) julgou procedente a Ação Penal (AP) 470 contra os dirigentes do Banco Rural Kátia Rabello, José Roberto Salgado e Vinícius Samarane pelo crime de gestão fraudulenta de instituição financeira. Quanto à corré Ayanna Tenório, o ministro votou pela sua absolvição.
“Formou-se na cúpula dirigente do Banco Rural verdadeiro núcleo criminoso estruturado e organizado mediante divisão funcional de tarefas com coordenação consciente de vontades para a realização da obra comum, permitindo que os agentes atuassem concertadamente com o propósito de cometer infrações penais em razão de finalidade específica, caracterizada pelo intuito de obter, direta ou indiretamente, vantagem consistente em benefício econômico ou vantagem de outra natureza”, avaliou. Segundo ele, os autos evidenciam a adesão livre e consciente dos réus Kátia Rabello e José Roberto Salgado a um projeto criminoso idealizado para viabilizar a perpetração de outros comportamentos ilícitos, “contribuindo eficazmente para o cometimento de delitos, seja de delitos contra o sistema financeiro nacional, seja de infrações penais contra a ordem econômico-financeira”. O ministro fez referência à perícia realizada pelo Instituto Nacional de Criminalística, que explicitou inúmeras irregularidades na concessão e renovação de empréstimos do Banco Rural ao Partido dos Trabalhadores, à SMP&B Comunicação e à Graffiti Participações.
Compliance
O ministro Celso de Mello explicou que a figura da compliance “tem por objetivo possibilitar a implementação de rotinas e condutas, ajustadas às diretrizes normativas fundadas nas leis, atos e resoluções emanados do Banco Central, bem assim normas apoiadas nas deliberações emanadas da própria instituição financeira – há um controle externo, mas também há um controle interno – em ordem a viabilizar de modo integrado as boas práticas de governança coorporativa e de gestão de riscos”. Conforme o ministro, a compliance tem a finalidade precípua de combater a corrupção, a lavagem de dinheiro, outras ações delituosas e, aparentemente, situações revestidas de ilicitudes, no campo penal ou administrativo. As práticas de compliance, prossegue o ministro, “devem ser encaradas como uma atividade central e necessária ao gerenciamento de risco das instituições financeiras e das empresas em geral, o que impõe aos administradores que atuem com ética, que ajam com integridade profissional e que procedam com idoneidade no desempenho de suas funções, e tal não ocorreu como o destacaram os eminentes ministros relator e revisor”.
Nesse sentido, o ministro Celso de Mello afirmou que os elementos produzidos nesse processo também revelam que o comportamento dos então dirigentes do Banco Rural [Kátia Rabello e José Roberto Salgado] constitui “notável exemplo a ser evitado, a todo custo, de desrespeito patente, intencional, consciente às exigências impostas pelo dever de observância das boas práticas de compliance”. Conforme ele, os empréstimos eram concedidos e renovados sem observância das cautelas mínimas necessárias impostas pelo Banco Central para a verificação da capacidade financeira dos clientes.
Modalidade dolosa
Em breve explicação, o ministro salientou que no crime de gestão fraudulenta de instituição financeira, não há como cogitar a modalidade culposa. Ele ressaltou que o comportamento dos dirigentes do Banco Rural foi eminentemente doloso. “O empréstimo foi concedido sem que houvesse cadastro dos clientes e, quando apareciam deficientes, eram ignoradas pelo Banco Rural”, completou.
Ayanna Tenório
Quanto à então vice-presidente do Banco Rural, Ayanna Tenório, o ministro Celso de Mello acompanhou a maioria dos votos já proferidos pelo Plenário do STF no sentido da absolvição da ré.
Vinícius Samarane
Em relação à conduta de Vinícius Samarane, o ministro entendeu que ele agiu em coautoria. Para ele, o réu participou ativamente dos relatórios, “produzindo peças enganosas e procedendo a incorretas classificações de risco, tendo adotado medidas para frustrar a função fiscalizadora do Banco Central, além de haver praticado de modo consciente e voluntário outros atos que convergiram no sentido de conferir operacionalidade aos desígnios criminosos dos agentes, unidos por um propósito específico. Tudo isso permite reconhecer, a meu juízo, a sua condição de coautor do fato criminoso”. O ministro anotou que o crime foi praticado em concurso de pessoas, “em ação orquestrada, com tarefas típicas de um grupo criminoso”, e explicou não ser necessário que cada um dos réus tenha praticado todos os atos fraudulentos que caracterizem a gestão fraudulenta. “Coautor não é necessariamente quem realiza o núcleo do tipo penal, mas aquele que realiza um fragmento no plano “operacional, que reflete uma atividade comum, exercida em função de um projeto criminoso comum”, observou. Vinícius Samarane, em razão do desempenho de tarefas específicas que lhe foram cometidas, incluía-se no curso do itinerário criminoso, voltado à prática de atos que consubstanciaram a efetivação executiva da gestão fraudulenta da instituição financeira em questão, mediante execução, desempenho de atribuições particulares de caráter operacional, circunstância que permite qualificá-lo como coautor”, concluiu o ministro Celso de Mello.
EC/AD
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